14 de out2016

Fundada a Aliança Latino-americana pela Diversidade e o Pluralismo na Comunicação

por nils

alianca3No dia 7 de outubro, 15 organizações não-governamentais de América Latina formaram a “Aliança pela Diversidade e o Pluralismo na Comunicação. ” É um grande desafio para a sociedade civil achar formas de proteger melhor a liberdade de expressão, ” pontua Aleida Calleja, pesquisadora e uma das coordenadoras do Observatório Latino-americano de Regulação, Mídia e Convergência (Observacom). Na sua declaração, os assinantes – entre eles a Fundação pela Liberdade de Imprensa (FLIP) da Colômbia, a Associação Mexicana do Direito à Informação (AMEDI), o Instituto Centro-americano de Estudos pela Democracia Social (DEMOS) da Guatemala e as organizações brasileiras Artigo19 e Intervozes – destacaram seis fatores centrais que afetam o Direito a Comunicação, e por isso guiarão as intervenções comuns:

“em primeiro lugar, o papel dos Estados para garantir e proteger a liberdade de expressão; o reconhecimento da forte concentração de meios de comunicação em mãos de grupos privados; a demanda aos Estados para ajustar os seus marcos regulatórios e implementar planos e políticas públicas ativas para garantir o pluralismo e a diversidade, em particular reconhecendo e promovendo ao setor da mídia sem fins de lucro, assim como também medidas concretas para garantir que os meios de gestão estatal funcionem como meios de comunicação públicos, e não como meios a serviço do governo de turno.”

O pronunciamento foi feito pouco depois de uma reunião de trabalho e um encontro internacional em Santiago do Chile, durante o qual, os aliados apresentaram ao público geral os resultados de algumas pesquisas realizadas nos diferentes países. Guillermo Mastorini, professor em diferentes universidades argentinas, abriu o evento público com um estudo realizado para o Observacom, que compara o nível de concentração dos meios de comunicação na Argentina, no Brasil, Colômbia, Chile e México entre os anos de 2000 e 2014. Enquanto os diferentes Relatores Especiais da Liberdade de Expressão da Organização de Estados Americanos (OEA) não se cansam de insistir na necessidade de reduzir a concentração da mídia, na grande maioria dos setores acontece justamente o contrário.

aliancaPara Mastorini, este resultado demonstra que até as mudanças de regulamentação dos governos progressistas “somente tiveram um efeito pontual, mas não conseguiram mudanças significativas. ” Porém, frente a atual disputa entre empresas de mídia audiovisual e telecomunicadoras, o pesquisador considera “decisivo” repensar os marcos regulatórios dentro de políticas públicas que reforcem a liberdade de expressão. “A regulação vai definir qual desses setores vai dominar sobre outros”, diz Mastorini, concluindo: “Deixar às empresas privadas a tarefa de definir o interesse público é perigoso.” Nessa mesma linha, Laura Tresca, do Artigo19, sublinhou que a sua organização já se pronunciou a favor de uma nova regulamentação do espectro eletromagnético, num posicionamento do ano 2002 chamado “Acesso às ondas”. Para ela, as perguntas feitas naquela época não perderam a sua atualidade, tanto em relação a uma redefinição da mídia, como na sua imprescindível regulamentação, especificamente no caso de plataformas dominantes. “Hoje, cada vez mais se usa o espectro para oferecer conexões à Internet. Ao mesmo tempo, estamos vivendo o desligamento de TVs analógicas, o que libera faixas do espectro. ” Tresca insiste em acompanhar de perto estes processos e formular propostas junto à sociedade civil, como, por exemplo, a dos provedores comunitários de Internet no Brasil, que através de uma “compra coletiva de sinal”, permitem aceder as redes de fibra ópticas sem passar por intermediários comerciais.

Além de outras análises específicas de casos, quase tod@s @s palestrantes também fizeram referência a diferentes processos de digitalização da mídia. Antonio Perrez, da Fundação da Comunicação pelo Desenvolvimento (Comunicándonos), de El Salvador, deixou claro que a promessa da digitalização de ser uma oportunidade para mais democracia e meios de comunicação democráticos não se cumpriu: “Ao contrário – na América Central a digitalização facilitou uma maior concentração da mídia. ” Enquanto ele lamenta “a falta de políticas públicas para administrar essa convergência”, como por exemplo um plano nacional da banda larga, Jorge Fernando Negrete, da AMEDI, lembra que é “uma responsabilidade compartilhada buscar metodologias para entender este novo ecossistema comunicacional e definir, de forma participativa, politicas digitais – algo que ainda não existe na América Latina.”

Re-regular para desconcentrar e evitar novos monopólios digitais – enquanto esta visão foi aparentemente compartilhada pelo público presente, durante o debate foi questionado o caminho geral proposto pelos palestrantes, que implicitamente definiram mudanças legais como pré-requisitos de novas práticas midiáticas. Porém, o caso do Coletivo Antena Negra, de Buenos Aires, que no ano passado conseguiu transmitir sinais terrestres de TV digital durante alguns dias, ou a experiência da organização Rhizomatica, que promove a telefonia celular comunitária no México demostram que as apropriações sócio-tecnicas já acontecem.

alianca2Não estas experiências conseguem abrir novas brechas nas sufocantes legislações vigentes que possam ser aprovadas por lutas legais mais amplas? Nesse ponto as opiniões divergiram. Enquanto Mastorini definiu estes exemplos como uma mera “auto-comunicação” sem o poder de transformar a distribuição das canais, concentrada em mãos de poucos, Calleja defendeu estas “novas experiências sociais e comunitárias” e lembrou que “a regulamentação somente tem razão em relação a uma progressividade dos direitos.” Ou seja: porque o Direito à Comunicação de uma comunidade não inclui (além de fazer rádio) organizar a sua própria TV digital ou uma rede celular? São estas e outras perguntas que vão manter ocupada a recém-formada aliança, que nas próximas semanas definirá as suas primeiras ações concretas em favor de uma comunicação mais diversa e plural. E “não se trata de um clube exclusivo”, diz Gustavo Gómez, do Observacom, quando interrogado sobra a ausência de algumas redes e representantes da mídia comunitária e pública da América Latina. “A maioria já sabe de nossa iniciativa” diz Goméz, e lembra que a aliança é o resultado de uma articulação pública que já começou no ano passado. “Então, espero que mais organizações se animem em participar. A porta sempre estará aberta…”

(por Nils Brock)

Para saber mais:

Organizaciones sociales afianzaron la “Alianza por la Diversidad y el Pluralismo en la Comunicación”

La transición de la TV digital produce escasos avances para la diversidad en América Latina

TV paga ronda el 90% de concentración de mercado en América Latina

19 de jan2016

A República decretada

por nils

franciscoDesde dezembro, a Argentina tem um novo presidente, o neoliberal Mauricio Macri. Pouco antes da eleição o ex-prefeito de Buenos Aires prometeu continuar os programas sociais do governo anterior, no entanto, de um jeito mais democrático e com menos culto à personalidade. Mas agora Macri usa as férias parlamentares de verão para governar sozinho com decretos presidenciais. O novo presidente conservador ataca, sobretudo, o setor de mídia e telecomunicações, critica o jornalista argentino Francisco Godinez Galay. Ele trabalha para a ONG Centro de Políticas Públicas para o Socialismo e é responsável, dentre outras coisas, pelo acompanhamento da política de mídia estatal. Falamos com ele da formação de possíveis novos monopólios até as ameaças da liberdade de expressão.

Na Argentina durante o recesso parlamentar governa-se exclusivamente por Decretos Presidenciais. O novo presidente Mauricio Macri disse que ele atua dentro das normas democráticas, o ex-governo fala de um golpe de Estado neoliberal. Quem está certo?

Ambas as descrições são precisas. Macri usa, sobretudo, os chamados decretos de emergência. Claro, que são instrumentos constitucionais, mas olhando para o conteúdo dos até agora quase 40 decretos, não há nenhuma urgência especial reconhecível. Ele abusa claramente e governa com mão autoritária em domínios políticos sensíveis. No campo da legislação da mídia, o poder judicial já tentou proibir as alterações, mas ele eliminou essa objeção com outro Decreto…

Este estilo de governança não é totalmente novo. Sua antecessora, Cristina Fernández de Kirchner, aproveitou também os decretos de urgência, por exemplo, para aprovar o orçamento das celebrações nacionais bicentenários contra a vontade da oposição.

Sim, Kirchner ainda detém o recorde de todos os tempos em termos de governar por decreto. Mas a coisa chocante do Macri é o que ele organizou em tão pouco tempo e qual é o alcance das suas decisões. Ele aboliu instituições do Estado, estabeleceu um novo ministério e nomeou juízes. Isso é um choque.

Acima de tudo, foi o ataque à regulação da mídia que causou as maiores protestos. Por quê?

O novo governo dedicou a maior parte dos decretos a este tema. Duas agências reguladoras independentes foram fechadas e se criou um Ministério das Comunicações, que é ligado diretamente ao governo. A partir de agora um único órgão controlará todos os meios de comunicação e a telecomunicação. As novas regras são significativas. Licenças de rádio e TV podem ser comercializadas como mercadorias, que não era possível anteriormente. Agora também é permitido que uma empresa de mídia possa controlar até 15 canais de televisão. Quem é beneficiário dessas mudanças senão os grandes conglomerados, como o grupo Clarín?

A abordagem parece muito metódico. Existe evidência de que as empresas de mídia participaram nesta reorganização legal?

Evidências claras não existem. Mas as simpatias entre um governo com perfil de negócios e os grandes grupos econômicos do país são óbvias. Muitos representantes do governo são membros de conselhos de grupos econômicos, por exemplo da empresa de telefonia móvel Telefónica ou o próprio Clarín. Não surpreende então que os jornais controlados por este último ator sejam muito partidários. Eles comentam sobre os acontecimentos recentes como uma “normalização dos meios de comunicação”, falam do “fim da guerra contra o jornalismo”.

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Quais são os argumentos que o Governo reivindica para exaltar esta reorganização do setor da mídia em comunicação com a população?

O Governo faz política apresentando as suas ações como livre de ideologia, embora eles introduzam muito consistentemente uma lógica de mercado em todos os espaços públicos. O presidente e seus ministros negam serem políticos. Por isso seus argumentos consistem em afirmações como: “Nós precisamos uma Internet mais rápida”, “os telefones celulares devem custar menos”. Estes são os seus cavalos de Tróia para conquistar a população, que, então, prontamente diz: “É verdade, a internet é uma merda e os telefones móveis são pura sucata”.

Com argumentos semelhantes o novo governo ataca também as estações de televisão pública que são difamadas como porta-vozes do Kirchnerismo. Houve demissões, um programa satírico foi retirado da grade, tem ameaças de cortes financeiros. De que maneira este conflito coloca em xeque a liberdade de expressão?

Distinguir entre a televisão estatal e organismos públicos de radiodifusão não são coisas fáceis em nenhum país da América Latina. Eu acho que é uma mistura de falta de compreensão e da constante tentação de usar os canais para fins de governo. Embora os índices de audiência em geral sejam bastante baixos, as emissões públicas certamente tem um grande significado porque ao contrário de muitas emissoras comerciais podem ser recebidas também no interior. Também, a estação de rádio pública Rádio Nacional, muito mais popular que a TV pública, garante um bom acesso à informação. Antes da sua eleição Macri prometeu limitar a influência da política sobre estas estações e outras instituições importantes, como o parque da ciência Tecnopolis ou o Centro Cultural Kirchner. No entanto, neste momento dedica-se, sobretudo, em demitir nestas instituições supostamente Kirchneristas, sem fazer mudanças estruturais para melhorar a independência editorial.

O Centro Cultural Kircher em Buenos Aires parece ser um projeto muito interessante, de fato. Mas a escolha do nome também facilita ao novo governo justificar demissões e cortes no orçamento.

Sim, claro que era uma bola da vez. Por outro lado, a administração anterior sempre transformou esta personalização e polarização da vida pública em capital político. O Grupo Clarín foi criado como um vilão genérico, os Macristas e o agronegócio funcionaram como antagonistas complementares. Mas esta confrontação permanente foi um erro do Kirchnerismo e Macri agora responde na mesma moeda.

E o que acontece com a participação da Argentina na Telesur? Este canal de televisão, financiado por sete países do Sul da América de Sul é conhecido como a plataforma midiática dos socialistas do século 21. Tem muitos espectadores dentro da Argentina? O governo Macri vai puxar a ficha?

A importância da Telesur na Argentina não é muito grande. O alcance é limitado porque o Clarín controla a maior parte da rede de TV a cabo e não passa o programa da Telesur na sua rede. Então, a Telesur é recebido apenas com outras operadoras de cabo menores e na TV digital terrestre. No entanto, o apoio da Telesur com dinheiro público da Argentina sempre foi controverso. Porque no programa há pouco espaço para a realidade argentina. Além do que Diego Maradona moderou um programa para a Copa do Mundo de 2014, a maioria do conteúdo é produzido na Venezuela. E com certeza, o alinhamento chavista da transmissora agora coloca nas mãos de Macri os argumentos para vetar a utilização dos fundos públicos.

Todo o conflito político dos últimos anos sempre se conta como um confronto entre o governo Kirchner e o grupo de mídia Clarín. Há certamente também outros atores influentes na mídia e na comunicação, por exemplo, a empresa de telefonia móvel, a Telefónica, que você já mencionou.

Claro, o tema não é apenas a televisão, também na Argentina acontece uma convergência midiática. Como tal, uma combinação de diferentes sistemas de comunicação não é nada ruim. O problemático é quem quer ficar junto com quem. Nós não estamos experimentando na Argentina o surgimento de novas empresas, ao contrário, Clarín e Cia. estimulam novos mercados através de ofertas de serviços cross-mídia. Clarín tem sido sempre a empresa de mídia mais forte do país e a Telefónica a líder no setor móvel e eles estão sempre interessados em vincular suas ofertas e criar pacotes de serviços. Mas a Lei de Mídia válida até agora tornou impossível impedir monopólios intersetoriais.

Sim, a lei da mídia proíbe isto. Mas a lei da comunicação digital, igualmente criado pelo governo anterior, permitia este tipo de fusões intersetoriais…

Sim, isso sempre foi inconsistente e lá você também pode ver que influência o lobby das empresas de telecomunicações tem na Argentina já por algum tempo. Eles se fortaleceram muito durante o governo de Cristina Kircher porque ela queria criar desse jeito um contrapeso para o Grupo Clarín. Mas Clarín rebateu, comprou a empresa Nextel e se converteu de um golpe no quarto maior ator no mercado de telecomunicações. Como a lei de mídia proibia isto explicitamente, começou uma disputa legal longa, que durou até o final do governo Kirchner. Mas como a nova agência de governo já levantou as barreiras ao investimento e fusões intersetoriais, as grandes empresas já não tem que se preocupar com estes detalhes. A filha argentina de Telefónica não precisa mais fingir que o seu canal de televisão Telefe pertence a empresa-mãe espanhola. E o Clarín no futuro pode abertamente agir como dono do provedor de Internet FiberTel que de qualquer maneira já faz parte do seu império depois da fusão com a Cablevisión, controlado pelo grupo Clarín. Às empresas não lhes faltam capital para conquistar novas fatias do mercado. Na Argentina não existem muitas empresas de telecomunicação sem fins lucrativos. E o futuro para estas será ainda mais difícil.

Que alianças estão lá? Na elaboração da Lei de Mídia adotada em 2009 foram envolvidas mais de 230 organizações públicas, privadas e sociais. O que resta dessa plataforma diversificada depois dos anos de polarização politica?

Os chamados governos progressistas dos Kirchners compreenderam bem como assimilar as demandas dos movimentos sociais e organizações de direitos humanos e dividi-los ao mesmo tempo. A Aliança ampla para a democratização da comunicação teve inicialmente muito legitimidade, mas a maioria das organizações no decorrer do tempo se modificaram conforme o governo, o consenso inicial na sociedade civil se desintegrou. Somente no final do reinado dos Kirchner, certa reaproximação ocorreu. As quatro principais redes de mídia alternativa e comunitária, entre elas a Associação Mundial de Rádios Comunitárias (AMARC) da Argentina, que haviam caminhado por trilhos separados por muito tempo, finalmente voltaram a se juntar em torno de uma pauta comum para um maior reconhecimento legal das estações de rádio e de televisão comunitária.

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Quais efeitos negativos você teme para as rádios comunitárias caso os decretos presidenciais em matéria de regulamentação da mídia persistam?

Ainda é difícil avaliar a extensão das ações governamentais e até que ponto as modificações destinam-se a ser perseguidas. Terá impacto negativo de qualquer modo, já que todos os parágrafos que restringem a concentração da mídia serão abolidos. Tanto mais licenças de rádio e TV estejam acumulando as empresas, menos espaço haverá para vozes independentes. Além disso, eu não acho que o novo governo está particularmente interessado em ampliar os espaços para mídia alternativa ou comunitária. Se o governo anterior não ajudou muito, particularmente, para colocar em pratica o que prevê a lei, então agora eu vejo ainda mais problemas. Acho que no futuro a obtenção de frequências será mais difícil, as condições de trabalho se complicarão. Talvez a gente volte até aos momentos em que os equipamentos de transmissão foram confiscados. De todo modo, estamos esperando muitas turbulências e poucas garantias para o nosso trabalho.

Até agora o governo justifica seus ataques com o argumento de que a vigente regulação da mídia reduziu a qualidade dos serviços de comunicação, impediu a concorrência, o investimento e a digitalização. Não somente os movimentos sociais na Argentina, mas também os observadores internacionais aparentemente discordam…

Sim, as intervenções do Relator Especial para a Liberdade da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), por exemplo, foram muito importantes. Este apoio será a chave para resolver o conflito atual. Até agora Macri não se incomodou muito com a critica das organizações sociais. Mas se a CIDH identificar nos seus relatórios, as modificações da Lei de mídia como um abuso legal, com certeza sentirá.

Agora, quando as leis existentes são desrespeitadas e modificadas de forma autoritária, articula-se certa autocritica por parte dos movimentos sociais que nos últimos anos se focaram, sobretudo, na luta legal? Um pouco de desobediência civil talvez tivesse criado fatos mais duradouros frente à onda de decretos…

Há autocrítica, sim, mas não em público. Muitos movimentos sociais e iniciativas políticas estão desiludidos e dizem, “depois de todos esses anos, parece que vamos ficar com as mãos vazias de novo”. Algumas iniciativas de mídia, como AMARC ou a Rede Nacional de Meios de Comunicação Alternativos (RNMA) sentem confirmadas suas críticas contínuas da execução insuficiente da lei de mídia nos últimos anos. Também a minha organização tem continuamente criticado deficiências na democratização dos meios de comunicação desde 2009. Por outro lado, também é claro que devemos defender o progresso que alcançamos mesmo que muitas ideias permaneceram presas no meio do caminho.

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Macri ainda tem algumas semanas até que voltem os tribunais no final de janeiro e o Parlamento no início de março para reiniciar o trabalho. Vai chover mais decretos ainda?

O perigo existe, mas acho que muitos dos decretos não vão encontrar uma maioria no Congresso. Especialmente com os decretos de emergência, a lei exige que eles sejam posteriormente confirmados pelo Parlamento. Mas, mesmo para isso, o governo certamente vai ter preparado uma estratégia. Vai ser difícil desfazer tudo o que acontece agora fora do controle parlamentar. As empresas de mídia continuarão a criar fatos, comprar novas licenças, também de forma intersetorial. 2016 ameaça ser uma grande briga judicial o que criará tempo para continuar a governar e fazer negócios…

Quando Macri ainda era prefeito de Buenos Aires, ele parecia muito receptivo a pesquisas de opinião pública. Será possível mobilizar uma massa crítica que incomode e capaz de manter ao mesmo tempo uma distância critica ao Kirchnerismo?

Estou otimista de que as organizações e redes sociais irão fazer um monte de barulho. Talvez Macri ignore isso num inicio do mesmo jeito como ignorou as vozes do Judiciário até agora. Mas um amplo movimento de oposição seria problemático para ele no longo prazo. Já havia algumas demonstrações nos últimos dias. Eu acho que sim, as lutais sociais na Argentina se intensificarão. E devemos comprar essa briga para finalmente colocar limites ao atual curso do governo.

Entrevista: Nils Brock

23 de set2015

Novas regras facilitam pedidos de outorga para rádios comunitárias e educativas

por nils

comrad_studioO Ministério das Comunicações publicou na última segunda-feira (21) duas portarias que visam desburocratizar o processo de outorga para novas rádios comunitárias e educativas. Pelas novas regras, para concorrer a uma autorização de rádio comunitária cada interessado terá de apresentar sete documentos e não mais 33. Já para as emissoras educativas, a exigência será de quatro documentos em vez de 18. De acordo com o Ministério das Comunicações, a modernização está sendo implementada por meio de duas portarias: 4334/2015 que revoga a norma anterior sobre radiodifusão comunitária e simplifica os procedimentos para o radiodifusor não exigindo mais a apresentação de projeto técnico da emissora; e a 4335/2015 que estabelece o trâmite relacionado à obtenção de outorgas de rádio e TV educativa. A diminuição da burocracia começou com a criação, em março deste ano, do Grupo de Trabalho de Desburocratização e Simplificação dos Processos de Radiodifusão (GTDS).

Com relação as rádios comunitárias, na nova norma, o Ministério também regulamenta as situações que configuram vínculo político, religioso, comercial e familiar dos dirigentes das entidades interessadas. Se comprovado o vínculo, o ministério pode indeferir o processo da entidade concorrente a uma outorga.

A portaria destinada às emissoras comunitárias também permite ao Ministério das Comunicações abrir editais de seleção de rádios comunitárias a qualquer tempo, além dos já previstos no Plano Nacional de Outorgas (PNO). Esses editais para abertura de novas emissoras, no entanto, devem contemplar exclusivamente comunidades tradicionais, como assentamentos rurais, áreas quilombolas e indígenas.

O representante nacional da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc Brasil), Pedro Martins, ressalta a importância de desburocratizar o processo de outorga das rádios comunitárias, mas diz que só isso não resolve o problema atual das emissoras. Segundo Martins, a criminalização dos comunicadores e a sustentabilidade das rádios são entraves ainda sem solução pelo governo.

As mudanças não agradaram a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão  (Abert). Em nota oficial divulgada no site da da Associação, a Abert afirma que a portaria 4334/2015 fere o princípio constitucional da complementaridade do serviço de radiodifusão ao estabelecer novas fontes de receita às emissoras comunitárias, equiparando-as à rádios comerciais.

ABERT informou que entrará na justiça para resguardar o direito dos associados e do setor da radiodifusão.

(Nota publicado primeiro no site da Pulsar Brasil)

14 de set2015

Pesquisadores discutem sobre um novo marco regulatório no INTERCOM 2015

por nils

mesa_intercomNa semana passada foi realizada no Rio de Janeiro a conferência INTERCOM. Lá, esse ano organizou-se também o 1º Fórum Socicom para discutir “Propostas para a elaboração de um Marco Regulatório para as comunicações brasileiras”. Murilo Cesar Ramos (UnB), o primeiro dos acadêmicos reunidos (sim somente acadêmicos que não tiveram a sensibilidade para convidar nem uma sequer pesquisadora feminina a esse “Clube do Bolinha”) perguntou direitinho sobre as atuais condições politicas para mudanças legais. A sua conclusão foi sombria: Precisa-se de “uma vontade politica do governo que não teve nos últimos 12 anos” e mesmo se esse milagre acontecesse, a atual composição politica do Congresso Nacional ainda reduziria a zero a aprovação de projetos de leis progressistas.

Bem ruim. Então, hora para ir pra casa e chorar nos cantos? Não, porque segundo Ramos sempre vão se abrir janelas de oportunidades. Anuncia-se por exemplo uma briga entre a grande mídia, grandes empresas de telecomunicação e novos atores comerciais tipo Whatsapp ou Uber – esses últimos acusados pelos primeiros de atuar como piratas nas redes 3G e 4G. Então, não existe também não um bloco monolíticos senão interesses divergentes frente a propostas de desenvolver a comunicação pública. Segundo Ramos, mesmo frente a um congresso conservador existe a possibilidade de fazer mudanças pontuais, por exemplo na hora de renovar licenças. Além disso ele achou importante discutir a regulamentação sempre sob a perspetiva de convergência entre Internet e Espectro porque “já não dá para discutir a radiodifusão isoladamente”.

mesa_intercom_voz_do_donoEsta foi a palavra-chave para o palestrante seguinte, Marcos Dantas (UFRJ), que levou slides e argumentos para 45 minutos mas teve que parar depois de 15. Insistiu em levar em conta antes de tudo o novo caráter capitalista pós-fordista (flexível, informacional e cognitivo) que influencia muito sobre o sistema comunicacional e reforça a dinâmica da convergência. Se antes foi possível distinguir sistemas de comunicação neutros ao conteúdo (ex. correios, telecomunicação e imprensa) e sistemas onde o conteúdo é essencial (ex. cinema, discos, radiodifusão) “essa distinção vira obsoleta a partir dos anos 80.” Hoje, segundo Dantas, já estamos vivendo uma profunda transformação das cadeias produtivas que devem ser analisadas para formular respostas regulatórias. O seu método proposto é diferenciar a comunicação por camadas de conteúdo, serviços e redes para aplicar regulamentações específicas. E para isso seriama necessárias mudanças de diferentes artigos constitucionais porque já não estamos falando de redes abertas [como mencionado na Constituição] senão de plataformas”, por exemplo ofertas de TV fechada não-lineares estilo Netflix. Frente a esse panorama, Dantas sublinhou duas lutas importantes a assumir: a “regulação por camadas” e a defesa e promoção da cultura nacional.

mesa_dantasEm oposição a Dantas, que levantou a voz repetidas vezes para martelar suas conclusões, o terceiro palestrante, Fernando Paulino (UnB) usou um registro bem diferente, perguntando sobre a metodologia mais adequada para o dialogo entre o governo e a academia quando se fala da regulamentação. Perguntou sobre os recortes analíticos de regulação (distinguir por camadas ou por tecnologias?), sobre uma desejável divisão de tarefas entre governo federal e entidades estaduais e municipais e sobre mudanças pontuais de artigos constitucionais (ex. Direitos de autores, tipificações de informação e calúnia, complementaridade e publicidade). Dessa forma Paulino abriu ainda mais o campo de assuntos que possivelmente deveriam ser re-regulados. Porém, ele deixou bem claro ao final da sua fala que “as normas somente são um primeiro impulso” que trazem consigo necessárias implementações e funcionamentos reais de politicas públicas.

“Nunca algo de tanta importância foi discutido por tão poucos”- com essa citação modificada de Winston Churchill, o palestrante, Edgar Rebouças (Ufes) começou a sua fala sobre “A sociedade civil nos debates da regulação das comunicações.” Apresentando um quadro das lutas ganhas e perdidas sobre o direito à comunicação nos últimos 30 anos Rebouças qualificou o bilam “ainda pior que o 7:1 da copa”. Mas vale então analisar as razões. Segundo ele pelo lado da sociedade civil e de intelectuais acadêmicos “faltam atores que discutem em torno da regularização” e que lutam para sua voz no conselho de comunicação social do congresso. “Não pode ser ser, como já foi o caso, que nesse conselho são ministros que representam a sociedade civil”, criticou Rebouças. Mas como envolver a “maioria silenciosa” nesse processo? Conscientizando nas sessões relevantes do congresso com faixas pode ser uma maneira de intervenção eficiente. Muito importante seria também envolver mais jovens na campanha em favor de um novo marco regulatório (PLIP) para formar um verdadeiro contrapoder, renovar a representação da sociedade civil e lhe permitir fazer parte da vida politica.

mesa_intercom1As críticas na mesa não foram dirigida só em direção de um poder abstrato senão também a um representante do governo federal ao seu lado, Octávio Penna Pieranti do Ministério das Comunicações. O servidor público analisou que para uma mudança legal normalmente precisa-se uma janela de oportunidades (“sem Edward Snowden não se teria aprovado o Marco Civil da Internet”) ou um momento “quando o setor regulado mede mais regulação”, ou seja, como por exemplo quando as empresas de telefonia celular pedem a proibição de ligações por Whatsapp. Como aproveitar esses momentos concretamente? Pieranti passou a bola pra academia que segundo ele precisa realizar mais pesquisas empíricas e análises econômicas do setor da comunicação. Além disso insistiu que depois do 2008 o cenário já mudou muito em favor da comunicação pública e comunitária: existem cronogramas publicadas no site do MiniCom quando se fazem chamados para novas outorgas de rádios comunitárias e está muito avançada já a regulamentação dos canais públicos de TV digital.

No debate Pieranti, que acha “excessivo a crítica dos servidores públicos as vezes” foi confrontado com o fato que ainda aplica-se a lei penal para fazer rádio de baixa potência sem outorga: “Isso é considerado um infração na Europa, aqui é considerado crime. Isso faz do Brasil a Coreia do Norte da comunicação na América Latina. Por que não sair desse papel?” Porque, segundo Pieranti (e contrário ao que propôs um relator da OAS algumas de semanas atrás) não é possível mudar isso por um decreto presidencial. A proposta já foi feita pelo governo mais não conseguiu uma maioria no congresso. Pobre Brasil, tão longe de deus e tão perto de Eduardo Cunha…

14 de jul2014

“É fundamental lutar pela democratização do espectro eletromagnético.”

por nils

Uma entrevista com Clara Robayo da ONG Radialistas Apasionadas y Apasionados, Equador.

No Equador existe o que no Brasil ainda não conseguimos: uma nova lei de meios de comunicação. Porém esse fato não automaticamente garante uma crescente liberdade de expressão e uma diversificação da radiodifusão, nos informa Clara Robayo, colaboradora da ONG Radialistas Apasionadas y Apasionados. Falamos com Carla sobre a perseguição de comunicadores e comunicadoras independentes no seu país, da luta das rádios comunitárias até uma autossustentação e o futuro uso do espectro eletromagnético.

Amarc Brasil: No Brasil, o Equador é citado, às vezes, como um país exemplar em relação a uma crescente liberdade de expressão. Porém, também ouvimos denúncias de organizações independentes de comunicação que foram fechadas pelo governo por supostas atividades ilícitas. Como explicam-se a circulação de relatos tão opostos?

oficina_pacha_mama3Clara Robayo: Na realidade é muito preocupante o que está acontecendo no Equador. Existem diversos exemplos que demonstram que a liberdade de expressão está ameaçada. Por exemplo, foi fechada a ONG Fundação Pacha Mama, devido a sua suposta participação num protesto. Durante esse evento um diplomata estrangeiro foi ferido com uma lança. Em vez de seguir um devido processo contra essa pessoa, que teria sido o mais lógico, o governo decidiu fechar a fundação. Justificaram essa ação juridicamente com o argumento, que como ONG não temos o direito de fazer política ou seja ter relações de proselitismo político. E se considera que a presença da Pacha Mama nesse ato violava esse acordo.

AB: Existe também uma intimidação individualizada de jornalistas que fazem pesquisas e escrevem sobre temas controvertidos no Equador?

CR: Sim também observamos ações contra jornalistas. Há um tempo, uma jovem jornalista estadunidense relatou um massacre de dois grupos indígenas Taromenane do Amazonas. Em seguida, o presidente do Equador, Rafael Correa saiu na televisão, falando que ela, sendo estrangeira, não tinha nenhum direito a opinar e que não era certo o que ela falava. Correa a desprestigiou como pessoa e muitos levarem isso à sério. Começaram a insultá-la nas rede sociais, um verdadeiro linchamento midiático. Isso é uma coisa terrível, promover o ódio no povo contra uma pessoa, isso não deveria acontecer. Cada pessoa tem o direito de expressar a sua opinião e de participar em debates.

No âmbito da música ainda tem outro caso, do cantor de música de protestos, Jaime Guevara. Ele fez um gesto desapropriado na rua quando passo a caravana presidencial. Aí Correa saiu do carro e ordenou que prendessem Guevara, acusando-o de estar bêbado. No relatório policial foram repetidas essas mesmas acusações, de que ele parecia bêbado e drogado. Uns dias depois, todas as pessoas que conheciam esse cantor, manifestaram que esse cantor era abstêmio e por uma doença cerebral nunca tinha tomado álcool. Era contrário a todos os medicamentos que ele tomava. A desculpa que Correa lançou foi que ele não tem a culpa de que outro parece bêbado e drogado.

Chegamos num ponto em que qualquer pessoa que diz algo crítico contra o regime é visto como a oposição. E não é assim. Deveria existir um ponto no meio a partir do qual se pode reconhecer as coisas boas, porque claro que existem coisas boas. Porém, sempre deve existir a possibilidade para debater.

AB: Além desses casos, Equador recentemente aprovou uma nova lei de comunicação. Como foi esse processo, de cima pra baixo ou houve uma participação da sociedade civil?

CR: Na verdade, isso foi um processo muito longo. Diversas organizações sociais no Equador estavam trabalhando já há muitos anos já para ver como democratizar e regular a comunicação de uma nova maneira. E diversas dessas organizações se juntaram para fazer uma reclamação junto ao presidente Correa sobre uma nova lei de comunicação, um regulamento que definiria normas para todo esse exercício. Formou-se então um agrupamento chamado Autoconvocados onde estavam presentes Aler, Corape, Siespal, Radialistas e outras organizações como El Churro, por exemplo. Eles estavam unidos para fazer incidência na elaboração da lei.

AB: E qual foram as reivindicações especificas dessa coalizão de organizações sociais?

CR: Este tema da tripartição igualitária das frequências radiofônicas entre rádios publicas, comerciais e comunitárias foi a bandeira desse agrupamento, influenciado um pouco pelo processo na Bolivia onde o uso complementar de radiofrequências foi reformado. Mas ao inicio nossa reivindicação foi muito mal visto mesmo por setores do governo. Na primeira reunião, os mesmas funcionários que depois começaram a apoiar a nossa agenda se esquivavam de nós e diziam que isso era uma loucura, que o espectro não era uma bolo que se repartia dessa lógica.

Depois disso Correa deu um passo muito importante e muito significativo que consistiu em nomear uma comissão de auditoria de frequências na qual foram pesquisadas as irregularidade de um leilão de frequências que ocorrera um par de anos antes. Antes da nova lei no Equador realmente vendiam-se frequências. O processo para ganhar uma frequência era, você pagava, para dar um numero, 6 milhões de dólares. E tinha diversos outros mecanismos que a comissão achou. Por exemplo, herdar frequências. Um pai simplesmente deixou de herança uma frequência aos seus filhos. Ainda outro esquema se chamava conversão-reversão. Alguém que já não queria uma frequência apresentou a um amigo que logo ficou com a frequência. Depois de entregar esses resultados a Correa ele falou que isso é era uma bomba-relógio e que teria que resolver esse problema imediatamente.

AB: E o que aconteceu?

oficina_pacha_mama4CR: Iniciou-se um processo de reforma que terminou em nada. A ideia inicial foi criar uma verdadeira tripartição das frequências e que todas essas frequências determinadas que não fossem legalmente concedidas voltassem às mãos do Estado para sua redistribuição. Mas isso nunca aconteceu. E logo, com a nova lei de comunicação queriam incluir de novo essa ideia da redistribuição e se criou uma norma transitória que definiu que todas as outorgas que não eram emitidas pelo órgão competente teriam que ser revertidas ao Estado e logo redistribuídas. O problema é que todas as irregularidades documentadas pela comissão demostraram a participação da agência reguladora CONATEL, ou seja, eles mesmos aprovaram as irregularidades. Por exemplo, existe um caso muito emblemático, o caso de Jorge Yunga, que presidia a CONATEL. Ele saiu para tomar um café, deixando o cargo temporariamente com um colaborador e quando voltou o outro já tinha confeccionado duas novas frequências. Ou seja, os mecanismos irregulares foram criados pelos reguladores. E da longa lista de frequências distribuídas dessa forma nenhuma foi revertida ao Estado. Até la aí chegamos com nossa luta por uma tripartição do espectro e uma reversão das frequências irregulares.

AB: Como foram afetadas as rádios comunitárias por essa distribuição irregular de frequências?

CR: Bom, antes da nova lei, por muito tempo não existia mídia comunitária legalmente, apenas uma televisão do movimento indígena em Cotopaxi. Porém, ainda antes da reforma legal, o governo em algum momento reconheceu a figura legal dos meios de comunicação comunitária e entregou 14 emissoras aos povos indígenas, como um reconhecimento de uma dívida histórica que havia. Atualmente o governo está criando mais meios comunitários. Mas não se trata-se de um processo no qual eu como organização social, como comunidade posso ir e solicitar uma frequência. Senão o governo está levando todo esse processo e são eles só que assinam as frequências. Já existem agora 54 dessas emissoras e vão ser criadas muitas mais. Mas correspondem a vontade do governo e não as reivindicações das comunidades.

AB: Mas imagino que articula-se uma crítica a essa atuação?

CR: O que se faz agora é informar as comunidades sobre o seu direito de poder organizar uma rádio e impulsionar-lhes para que exijam a sua frequência. Mas até agora somente estão reunindo essas solicitações em muitas pastas para decidir sobre esses casos conjuntamente. Vamos vendo o que vai acontecer. Eu temo que ninguém vá conseguir uma frequência, mas mesmo assim temos que pressionar. Aos meios de comunicação comunitários que operam foi tudo facilitado no começo, todos os equipamentos para que funcionassem. Isso inclui até duas pessoas com salários de 700 dólares (ca. 1400 Reais) cada um para que trabalhem na emissora. Então existe uma tutela do Estado para que essas rádios funcionem bem. Uma tutela para que eles não precisem se sustentar-se sozinhas, o Estado lhes está dando tudo. E isso é muito perigoso. Pode parecer muito positivo mas no momento em que o Estado já não tem recursos para dar-lhes a emissora não vai ter como seguir funcionando.

AB: Mas o que determina a lei, então? Fala-se da sustentabilidade, de um número de frequências, etc.?

CR: A lei diz que rádios comunitárias podem vender serviços, produtos e podem vender espaços publicitários para sustentar-se sob essas lógicas. Mas isso não acontece, as rádios que recebem uma outorga também recebem esse grande apoio material e mão de obra. É esquisito, assim nem fazem uso das possibilidades da lei que coloca quase nenhum limite no funcionamento.

AB: Mas devem existir limites de potência e outras normas?

CR: Bom, depende onde se solicita uma outorga, se existem frequências disponíveis ou não. Primeiro se faz um estudo técnico antes de permitir uma rádio comunitária. Existem muitos requisitos, devem ter por exemplo também um certo montante de dinheiro para demonstrar que podem manter a rádio no ar por um tempo.

AB: E como vocês com Radialistas atuam nesse contexto? Quais são as suas contribuições especificas?

CR: Radialista vinculou-se bastante com o processo de elaborar essa nova lei. Estivemos lutando muito pela aprovação da tripartição igualitária das frequências. Também organizamos falas e seminários, vamos as emissoras que agora existem para falar sobre a sustentabilidade para que as rádios vejam que é possível existir sem depender do Estado. E também nosso trabalho está enfocado na capacitação das rádios para que possam produzir melhor para que tenham os recursos e insumos para fazer uma boa programação. E além disso trabalhamos também em outros países, observamos os processos e a aplicação de outras leis para preparar e poder ajudar no caso que uma emissora solicite ajuda. Por exemplo colaboramos bastante com rádios no México, na Colômbia, na Bolívia e em outros países para que as rádios comunitárias de lá consolidem-se mais.

AB: Na América Latina atualmente fala-se muito também sobre uso compartilhado do espectro eletromagnético como um bem comum. Como está sendo construído esse debate no Equador?

oficina_pacha_mama5CR: Como já falei, partimos do princípio de que o espectro deveria ser repartido de forma igualitária: 33% para rádios públicas, 33% para rádios comerciais e 33% para rádios comunitárias. Também existe um debate sobre a digitalização. Defendemos, no caso da televisão que seja implementado o padrão nipo-brasileiro que permite colocar quatro canais por frequência, ou seja vai ter espaço para quatro vezes mais canais. E também no caso da TV digital aplica se tripartição igualitária da qual falei em relação ao rádio. É um espaço que ainda é pouco usado. Mesmo as empresas comerciais da TV que têm outorgada uma frequência ainda não fazem uso da possibilidade de transmitir quatro programações diferentes. Um tempo atrás havia um debate sobre uma lei secundaria que estabeleceria que a mesma pessoa que é a concessionária da frequência também é a única responsável por esses quatro novo canais. Mas bem, essa é uma lei secundaria e eu acho que esse princípio não vai ser estabelecido. Mas temos que ficar atentos para que realmente seja estabelecida uma repartição equitativa dos novo canais digitais. Porque essa luta é fundamental para democratizar o espetro eletromagnético.

AB: Mas, de qualquer forma, a radiodifusão digital é condicionada já hoje com a seleção de padrões, com a alocação de faixas do espectro. As mudanças de outras mídias, de outros serviços de comunicação que fazem uso do espectro eletromagnético influenciam bastante. Difícil tratar o rádio como um caso aparte…

CR: Claro, essas mudanças levam diretamente a pergunta sobre o que é um meio de comunicação comunitária. Nós achamos que qualquer comunidade, organização ou grupo – eu sublinho isso porque no Equador falando das comunidades muitas vezes somente acham que se fala das comunidades indígenas – tem o direito de fazer mídia. Ou seja, qualquer pessoa da sociedade civil já individualmente tem o direito de aceder ao espectro. Faz parte do direito de cada um de nós exercer o nosso direito universal à comunicação, a expressar o que sentimos e a gozar da liberdade de expressão. Um meio comunitário se faz entre todos e todas e o sustentamos também dessa forma, juntos. Então tem que lutar para que todos e todas tenhamos acesso a esses meios para que ninguém seja privilegiado e para que possamos ouvir as diferentes vozes

A entrevista foi realizada por João Paulo Malerba e Nils Brock

Links:

  • Entrevista em formato PDF
  • Radialistas Apasionadas y Apasionados, Equador
  • Sobre o fechamento da Fundación Pacha Mama
  • Artigo controverso da Newsweek sobre os  Taromenane
8 de nov2013

A legislação internacional e nacional das rádios comunitárias

por nils

Acordos internacionais

uno1948Hoje, ainda não existe um país no mundo onde o direito à comunicação seja reconhecido plenamente. Porém, há vários acordos que exigem que seja respeitado esse direito humano nos distintos estados-nação. O Brasil se comprometeu a respeitar e incentivar a livre expressão e a comunicação com a assinatura da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) e a ratificação da Convenção Americana de Direitos Humanos (1992), também chamado Pacto de São José.
Conheça esses acordos internacionais:

  • CLIQUE AQUI – Declaração Universal dos Direitos Humanos (ver sobretudo o Artigo19)
  • CLIQUE AQUI – Convenção Americana de Direitos Humanos (ver sobretudo o Artigo13)

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7 de nov2013

AMARC ALC saúda a resolução constitucional da Lei de Mídia na Argentina

por nils

leidemidiaDepois de trinta e três anos, a democracia Argentina consegue derrotar por completo o Decreto Lei que impôs a ditadura militar sobre a radiodifusão e os serviços de comunicação audiovisual. Um dos últimos vestígios dos momentos mais duros vividos na história da República Argentina.

Lei de Radiodifusão 22.285[1] foi a expressão de uma doutrina de segurança nacional, que reduzia e coagia a liberdade de expressão, permitindo a mercantilização e concentração midiática da comunicação. O artifício legal envolveu a capitalização financeira dos meios, o qual deu as bases para sua centralização sob um mesmo grupo econômico de poder.

Com isso, qualquer normativa no campo da comunicação corria o risco de desvirtuar-se e beneficiar diretamente os monopólios audiovisuais, por isso a urgência em promulgar uma lei na democracia. Depois anos de intenso debate e intenções silenciadas, a Coalizão por uma Radiodifusão Democrática, integrada por sindicatos de imprensa, rádios comunitárias e organizações da sociedade civil – ONGs e universidades-, declarou os 21 pontos básicos pelo direito à comunicação[2], os mesmos que colaboraram com a origem da Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual[3], recentemente declarada constitucional.

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30 de jul2013

Customizar o galinheiro

por nils

Nova norma melhora a situação legal das rádios comunitárias no Brasil, mas fica longe de atender as reivindicações do movimento.

O dia 2 de Julho 2013 o governo brasileiro anunciou a alteração da muito controvertida Norma 01/2011 que rege a radiodifusão comunitária (ver Portaria Nº 197, 07/2013). Apesar parecer umaresposta governamental para acalmar as manifestações nas ruas, a modificação legal é, sobretudo, o resultado de amplas mobilizações das rádios comunitárias durante todo o ano passado. O Movimento Nacional das Rádios Comunitárias (MNRC), Abraço e AMARC Brasil organizaram debates, críticas e diálogos construtivos com o Ministério das Comunicações. O fruto desses esforços, poucas vezes coordenados, mas felizmente apontando na mesma direção, significa uma leve melhora da vigente regulamentação da Lei 9612, a base legal das Rádios Comunitárias no Brasil.

O que mudou?

Na página web do MiniCom há um bom resumo das mudanças relevantes para @s radialistas comunitári@s. Sem dúvida, as novas regras do jogo vão facilitar fazer rádio comunitária, mas ficam muito longe duma verdadeira reforma agrária no ar. Como não basta customizar o galinheiro, vamos comentando aqui as mudanças previstas a partir das reivindicações da AMARC, baseados nos 14 princípios para um marco regulatório democrático sobre rádio e TV comunitária.

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