10 de out2016

ENCONTRO EM ALTER DO CHÃO DEBATEU SOFTWARE LIVRE, DIREITOS DOS POVOS TRADICIONAIS E ANCESTRALIDADE

por deniseviola

Encontro do projeto mídia dos povos em Alter do Chão, no Pará. (foto: mídia dos povos)

Comunidades indígenas e ribeirinhas ameaçadas por barragens; negros quilombolas resistindo à violência institucional e criminalização da cultura afro-brasileira; troca de saberes ancestrais e muita pajelança. Esses foram os temas que atravessaram o segundo encontro do projeto  Mídia dos Povos, da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc), que ocorreu entre os dias 21 e 25 de setembro em Alter do Chão, no Pará. A atividade reuniu representantes de povos tradicionais e ativistas de diferentes comunidades da Amazônia para uma imersão sobre software livre e mídias comunitárias.

O encontro contou com a parceria do Coletivo Puraqué que há anos atua com inclusão digital através do software livre em Santarém. Os Software livres são programas abertos e gratuitos. Além de garantir o acesso mais democrático dos programas, o uso deste tipo de software garante que o usuário não precise pedir qualquer permissão ou se comprometer com licenças proprietárias restritivas.

A coordenadora do Mídia dos Povos, Luiza Cilente, afirma que o projeto entende que estimular e garantir cada vez mais o uso deste tipo de software junto às comunidades e projetos de mídia alternativos, comunitários e livres, permite a maior liberdade e autonomia aos mesmos. 

O grupo dá continuidade ao ciclo de encontros que se iniciou em agosto deste ano no quilombo do Curiaú em Macapá, no Amapá, onde quilombolas debateram políticas afirmativas em rádios livres e comunitárias. Rejane Souza e João Ataíde, representantes dos quilombolas, estiveram presentes em Alter do Chão para compartilhar sobre essa experiência e trocar sobre novos saberes.

Milson dos Santos, ativista do Maranhão, apresentou a plataforma de autocartografia Lagbaye Lyika que permite o envio de denúncias de situações de violência, mapeando áreas de riscos para alertar pessoas e organizações sociais. Outro participante, Josivan dos Santos, morador da comunidade  ribeirinha de Juruti Velho, também no Pará, aproveitou para colocar no mapa denúncias sobre os impactos ambientais e violações de direitos provocados pela multinacional Alcoa ao explorar bauxita na região da comunidade.

Indígenas Munduruku também estiveram presentes no encontro. Eles explicaram sobre o processo deautodemarcação de suas terras. Marunha Kirixi da aldeia Sawré Muybu contou sobre a experiência de um grupo de mulheres munduruku que estão se apropriando de equipamentos para documentar e criar suas próprias produções audiovisuais sobre a etnia.

O próximo encontro vai ocorrer no final de novembro na aldeia de Marunha, localizada  próximo a Itaituba, no Pará onde os participantes irão debater produção e gestão de projetos. Também será realizada uma oficina de edição de vídeo em software livre. (pulsar/mídia dos povos)

24 de ago2016

Libere a sua rádio!

por deniseviola

No Brasil a “Red de Radios Comunitarias y Software Libre” ainda é pouco conhecida. No resto da América Latina, o lema do grupo pluri-nacional “Libera tu radio!” (ou seja “Libere a sua rádio!) já convenceu muitos coletivos radiofônicos. A mensagem é clara: fazer uma rádio comunitária usando software proprietário a largo prazo não pode ser uma experiência libertadora. Quem ainda usa sistemas operativos como Microsoft ou OS X normalmente se sente bastante desconfortável com este tipo de comentário. Os primeiros reflexos mais comuns são:

Ah, mas fazer rádio é uma prática social, pouco importa a parte da tecnologia.”

Software livre é assunto da classe média ou dos jovens universitários. As pessoas comuns não tem como conquistar estas ferramentas com tanta facilidade.”

O Linux é muuuuito complicado e não funciona bem. Eu aprendi a editar áudio com um programa que nem rola lá. Por que aprender algo de novo que já foi resolvido?”

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Para enfrentar estas e outras críticas (que nunca faltam) a Red organiza um encontro anual continental. Este ano o encontro teve lugar em Quito, Equador. Chegaram dezenas de rádios comunitárias e livres desde a Sierra Madre até a Terra do Fogo. “Nos juntamos aqui”, comentou Jorge Cano da Radio Wambra (ECU) “porque fazer rádio é uma busca permanente. Temos que deixar para trás supostos conflitos geracionais. Hoje se fala muito da defesa da soberania, então, as rádios não podem ficar fora desse debate. Devem ser espaços soberanos, onde acontece uma constante liberação de conhecimentos”.

Mas como? Esta é a grande pergunta que marcou também este “II Encontro de Rádios Comunitárias e Software Livre”. Impossível documentar todas as vozes e propostas, mas seguem algumas que se destacaram:

Dafne Moncada, Radio Plazeres (Chile)

A nossa rádio existe há 27 anos. Participam diferentes gerações, e para algumas, a questão digital não é para nada fácil. Além disso, o Chile é muito atrasado com o tema de software livre – quase não se debate no governo ou nas organizações sociais. Para falar a verdade, na rádio usamos vários programas de software livre, mas o sistema operativo ainda é Windows. Queremos avançar nisso em parceria com os participantes da Rádio Pirata, que também transmite em nossa cidade, Valparaiso. Eles contam com militantes de software livre. Sem esse contato, será difícil seguir adiante, porque as capacidades a distância, sozinhas, não são suficientes.

Angelica Cárcamo, Red ARPAS (El Salvador)

Estamos no ar desde os anos 90. Em El Salvador tem uma frequência só para as rádios comunitárias, mas estamos aproveitando bem esse espaço. Achamos que o software livre é uma ótima ferramenta para descolonizar as mentes. Pra nós, é fundamental! E por isso a nossa rede se colocou uma meta concreta: até o ano 2025, todos os associados da nossa rede vão usar só software livre. Como conseguir isso? Pois já estão previstas uma série de oficinas para facilitar a migração e a apropriação de GNU-Linux e outras tecnologias.

Ivan Terceros, Medialab UIO (Ecuador)

Devemos abraçar a criação de espaços livres, onde acontece a apropriação da tecnologia. A gente poderia seguir lamentando a brecha digital – ou repensar as práticas, e simplesmente fazer coisas! Eu vejo a tecnologia como um ato político e cultural. Não existe uma tecnologia só, os universalismos não servem porque qualquer proposta global demais vai fracassar. Ao invés de esperar melhores condições, temos que começar a descolonizar a produção dos códigos. E nisso, temos que exigir também a presença do Estado, porque é o seu dever favorecer o desenvolvimento de uma tecnologia social.

Alex Llumiquinga, ALER (Peru)

A proposta da nossa rede sempre foi comunicar e educar. Ao longo da nossa história, sempre tivemos interesse em desenvolver uma ampla consciência tecnológica, trabalhando com a imprensa escrita, rádio escolas, plataformas satelitais e Internet. Agora acabamos de publicar uma “Carta do Futuro” na qual definimos nossos passos até o ano 2020. Em relação ao software livre, queremos apoiar e colaborar com todos os grupos que trabalham com tecnologia, e pensar em iniciativas comuns. Ideias não faltam: laboratórios populares, um sistema de telefonia intercontinental e grupos de trabalho temáticos. Achamos importante ampliar nossa cooperação porque isto permitirá novas experiências com grupos que compartilham princípios e valores das rádios comunitárias.

Bruna Zanolli, Rádio FMea (Brasil)

Para mim, as rádios livres são espaços de contracultura, onde acontece uma produção diferenciada com software livre, por exemplo, para editar áudio ou fazer um trabalho gráfico. É todo um processo de aprendizagem, mas vale a pena. Muitas vezes precisamos usar mais de uma ferramenta de software livre para fazer o que se faz com uma só no software proprietário. Tem que ter ternura com a sua própria aprendizagem, não se estressar. Acho que uma boa forma para aprender é fazer um manual ou tutorial baseado na sua própria experiência. Desse jeito os conhecimentos são compartilhados.

Inoscencio Flores, Radio Huayacotla (México)

A nossa rádio nasceu como uma escola radiofônica no ano de 2005. Sempre quisemos transmitir por Internet também, mas sozinho não rolou. Achamos um apoio pouco comum: há cinco anos atrás, um jesuíta australiano ofereceu ajuda online. Depois do primeiro contato, ele também nos visitou várias vezes. Hoje trabalhamos só com software livre, mas ainda temos alguns problemas. Trabalhar na linha de comandos não é fácil, e nossa conexão de Internet segue muito lenta…

Jorge Cano, Radio Wambra (ECU)

A liberdade não se deve a uma condição só, senão a articulação conjunta de diferentes dinâmicas: comunicação segura, criação de novas ferramentas, uso de software livre, etc. Precisamos liberar as palavras e as práticas. E quando não se tem o espaço necessário, se constrói. A gente não pode falar somente do conteúdo, temos que articular a soberania da comunicação em todos os âmbitos. No Equador, por exemplo, existe um concurso nacional de frequências, que permite legalizar rádios comunitárias. Mas isso não influi sobre as condições de fazer rádio mesmo. Temos que trabalhar num tecido social onde confluam os diferentes movimentos e lutas, para colocar a nossa agenda e definir as nossas regras.

E agora José? Depois de todos estes testemunhos motivantes, por onde começar? Existem muitos caminhos, e a AMARC Brasil começará, ainda este ano, a organizar oficinas para apoiar os primeiros passos na libertação da sua rádio. E para quem não quer esperar mais, a Red de Radios Comunitárias y Software Libre oferece um tutorial bastante completo para instalar o sistema operativo GNU/EterTICs (Debian) – uma compilação de programas pensado especificamente para as rádios comunitárias e livres:

https://liberaturadio.org/article/instalacion-completa-gnuetertics-videotutoriales/

 

10 de ago2016

Amarc Brasil no Encontro sobre Software Livre no Equador

por deniseviola

Por Jaqueline Deister

Por Jaqueline Deister


Nos dias 1, 2 e 3 de junho ocorreu o II Encontro Rádios Comunitárias e Software Livre, na cidade de Quito no Equador. O evento foi sediado na Faculdade Latino Americana de Ciências Sociais (Flacso) e contou com a participação de radialistas comunitários e livres de diferentes países latinos.
Durante os três dias de evento, foi possível conhecer mais a fundo a experiência de rádios e coletivos que se apropriaram do software livre em seus estúdios. Desde comunidades rurais no interior do México, até a própria rádio da Flacso se apropriaram desta cultura livre de maneira a repensar as questões políticas e de segurança por trás de softwares e serviços comerciais.
O encontro contou com palestras e oficinas que esclareceram sobre o uso dos programas e sistema operacional livres. Ao todo, foram doze oficinas distribuídas nos três dias de evento, que abordaram questões mais técnicas como programação avançada, destinada à operadores de áudio; edição de áudio passando pelo audacity e o profissional ardour; edição de imagem por meio do Gimp e Inkscape; telefonia via internet e comunicação segura. Esses são apenas alguns exemplos do que foi abordado nas oficinas.
Dentre as oficinas, chamou atenção a de comunicação digital e segura, ministrada por Oliver Piper e Jávier Obregón. O encontro mostrou as ameaças constantes às quais estamos expostxs na internet, e a facilidade com que os nossos dados pessoais são pegos por grandes empresas.